O Brasil tem uma situação privilegiada em um mundo ameaçado pelas mudanças climáticas. É um dos poucos países – e certamente a única grande economia – com possibilidade de gerar toda a sua eletricidade a partir de fontes limpas. Cerca de 83% de nossa eletricidade vem de usinas hidrelétricas ou nucleares, que não geram emissões poluentes para a atmosfera.
É uma posição invejada por países como a China, que tem uma matriz energética 70% dependente do carvão, o mais poluente dos combustíveis. Mesmo a Alemanha, louvada no mundo por suas iniciativas verdes, só produz 14% de sua eletricidade a partir de fontes renováveis.
Isso pode ser uma vantagem competitiva para o país. Primeiro porque, nos próximos anos, mesmo as nações em desenvolvimento provavelmente terão de assumir metas para reduzir ou limitar as emissões poluentes. Em segundo lugar porque blocos como a União Europeia já discutem taxar as indústrias pela emissão de carbono. Nesse cenário, as empresas ficariam atraídas a implantar fábricas em países com geração de eletricidade mais limpa. Apesar de tão importante para o desenvolvimento industrial do país, a manutenção de nossa matriz energética pouco poluidora tem sido esquecida diante do desafio de conter o desmatamento.
Por causa da devastação das florestas, responsável por 75% de nossas emissões de poluentes, o Brasil está em quinto lugar no ranking global dos grandes poluidores. Mas a Amazônia pode deixar de ser um problema ambiental e virar parte da solução. O mecanismo que pode permitir receber dinheiro pela preservação, chamado Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), será um dos temas mais importantes nas negociações internacionais sobre como o mundo deve enfrentar as mudanças climáticas, em dezembro, na Dinamarca. Muitos países estão dispostos a pagar para o Brasil não derrubar suas matas. É o começo de um futuro mercado para as florestas, similar à bolsa de créditos de carbono, na qual quem reduz suas emissões do gás pode vender certificados a quem não conseguiu cumprir suas metas de redução. Se o REDD for aceito como um instrumento de combate à crise climática, o Brasil poderá receber dinheiro para financiar medidas de fiscalização e incentivo à produção florestal sustentável.
É uma tendência ótima para o país. Só que ela nos desvia de outra preocupação para o futuro – continuar produzindo energia limpa. A seguir, os principais desafios do país.
Compensar os meses de baixa produção hidrelétrica – O Brasil precisa de alternativas para as hidrelétricas entre os meses de junho e novembro, quando os reservatórios estão mais baixos, pela redução nas chuvas. Para suprir essa lacuna, o plano decenal de energia do governo federal prevê a construção de 81 usinas térmicas até 2017, das quais 68 alimentadas por combustíveis fósseis, que produzem gases do efeito estufa. A opção poderia ser outra. Estudos da Empresa de Pesquisa Energética concluem que o potencial brasileiro para geração eólica é de 143 gigawatts. É mais que uma vez e meia a capacidade instalada de todas as nossas usinas hidrelétricas, nucleares e termoelétricas juntas. Mas hoje não aproveitamos nem 1% do potencial dos ventos.
Aumentar a eficiência energética das casas – Parte da demanda de eletricidade é causada por ineficiência nos prédios e nas casas. O Brasil tem baixo uso de lâmpadas fluorescentes, de menor consumo. E 15% da demanda nacional de eletricidade nos horários de pico é puxada só pelos chuveiros elétricos. Um exemplo de como resolver isso é a Espanha. A partir de 2003, o país começou a exigir que as novas construções usassem aquecimento solar ou a gás. E as prefeituras, como a de Barcelona, passaram a subsidiar a troca de aquecimento elétrico por gás e solar.
Substituir o diesel de ônibus e caminhões – Os programas para usar combustível de origem vegetal e não poluente nos veículos pesados ainda não ganharam escala – diferentemente do etanol, que vem da cana, o biodiesel é produzido a partir de óleos vegetais, como óleo de mamona, soja, dendê, girassol e algodão, que geralmente têm maior valor comercial se vendidos para outros fins. Daí que o biodiesel atinge apenas 3% do combustível usado por nossa frota. Países como a China, os Estados Unidos e a Alemanha apostam em mais trens e navios para transportar cargas. Agora estão adotando ônibus híbridos, elétricos e apostando no hidrogênio.
Melhorar a tecnologia dos automóveis – A frota mundial de veículos híbridos passou de 1 milhão e deverá dobrar nos próximos dois anos, mas até hoje não existe nenhum carro híbrido rodando no Brasil. “A barreira é econômica. Os carros híbridos saem mais caros que os convencionais”, diz Luso Ventura, diretor de Comissões Técnicas da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade, a SAE Brasil. A grande chance do país no mercado dos híbridos seria adaptar esses motores à tecnologia flex nacional. Daria ao Brasil mais competitividade no mercado internacional. Hoje, apenas a Mitsubishi mostrou interesse em trazer a tecnologia ao país. “Deveríamos investir logo em híbridos para não ficar atrás no domínio da tecnologia, mas não acredito que isso vá acontecer por incentivo do governo, e sim por iniciativa das próprias empresas.”
Fonte: Revista Época